Quinta-feira, 14 de Fevereiro de 2008
.Espelho
Uma mentira servida numa bandeja de prata
Alinhada com a vertical
[pergunto-me se a verdadeira ou a aparente]
Uma lâmina acorda-me a cara
Arranca o sangue do seu sono submerso
Deixando-o, no entanto, imerso sob os muros íngremes que são a pele
Ainda me dói a lucidez da luz
Principalmente, a que é esculpida pelo espelho
Renegada, disforme e suja de mim
Olhos engolidos por duas insones sombras
De um negro húmido e cristalino
Escorrem-me rios da alma
Levando-me a cada evaporação
Perfumo a cara com um sorriso
Invoco aos músculos trémulos alguma acção
A suficiente para num sorriso esconder a solidão.
Sábado, 12 de Janeiro de 2008
.Pele granítica
Lascada pelas mãos difusas do tempo
Talhada entre agruras e dores de parto
Rugas fundas lavradas na pele
Por arados feitos de um material sucedâneo do aço
Mas que não encontra eco no mundo material
A Geografia da desolação tem traços de irreal
Apesar de ser firme e concreta nos corações das mulheres e dos homens
Corações que lentamente se transformam em granito denso
Tendente a parar de bater
A alimentar de espasmos os ecos da solidão
A rosa dos tormentos e
Os seus pontos mortais
Representação de uma geografia sórdida, sardónica e letal
Olhos que não conhecem as letras
Nem as mentiras circunscritas
Ensinadas por epítomes do saber
Que propagam a geografia sub-humana
Onde fica o coração dos Homens
Depois de ser empurrado e desolado para os lados da solidão
Onde subscrever uma morte mais digna e letal
Esqueletos de granito erguidos pelos homens
Sepulcros supra-térreos de memórias íngremes
Entregues à mais geográfica desolação.