Imbui de fé o punhal. Usa-o com suprema sapiência para trespassar a fronteira que é a pele. Embora não saibas, segues ritos e regras ancestrais. O ónus do teu sangue.
A fé é o calor da tua mão, aquele que transmites à madeira do cabo. O calor que invade a madeira morta por ter sido privada de raízes. Madeira com veias que mais não são que estradas desertas. O silêncio onde outrora escoava uma seiva turbulenta e borbulhante. Agora sabes que agarras a morte. Agarra-la com firmeza para que a lâmina encontre o seu caminho e cumpra a sua profissão de fé.
O sangue que escorria pela lâmina num fio contínuo ramifica-se num emaranhado de destinos. Seguras um ícone da vida empunhando a morte. Macabro relicário, afinal uma mera extensão da tua mão. Desconhecias que a tua mão pudesse estar a mesma temperatura que o confortável cabo de maneira, mas agora sabes que a temperatura é a mesma. Apenas o arrepio é desigual.