Atravesso a morte, um campo de diurno verde povoado, quando a noite é rainha, de visões horripilantes plenas de nados mortos. Não corro, sei que seria inútil qualquer tentativa de evitar pisar os ossos desprovidos de carne que estão semeados pelo chão. Percorro-me, em tentativas aflitivas de esconder à alma aquilo que a turva a uma suprema consternação. Adio-me por entre a bruma fétida e o bafio bolorento dos cadáveres, que encontro mais à frente: informes desprovidos de ossos e carentes de estrutura. Meros retalhos de carne perecida às garras do tempo. Tempo que invento, que recordo e renovo a cada passo. Cronos é generoso na sua dádiva, cortês na sua maldição…
Uma estranha formação no céu, uma espécie de arco-íris feito de tons de cinzento e de um negro filho do breu, prenuncia a luz. Precipitam-se restos de noite, sob a forma de um condensado frio que se entranha nas ossadas e nos recantos da pele cobrindo-as de um verde que esmorece até se tornar um preto de pleno carácter. A luz existe, a noite persiste para lá do luar.
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