Recordo e, quase, que sinto aquele vento primordial a ecoar sobre a minha cara. Caminho no nevoeiro que cobre a beleza de beleza. Sinto o cheiro da manhã na terra húmida. Subo pela estrada poeirenta da montanha, rumo ao sítio com a visão mais linda que conheço. Subo sozinho juntamente com a minha solidão. Subo carregando o peso do desespero e da dor. Subo com o objectivo de purificar o meu ódio. Subo com o objectivo de renegar o amor. Subo de dia, mas na mais completa escuridão. Esperança, é uma palavra vã. Eu sou vão, eu sou um grito de revolta, eu sou um patético ser, eu ... Cheguei, como é lindo o vale profundo diante de mim! Já não há nevoeiro, vejo muito adiante. Vejo o cheiro do mar a tocar no céu. Grito a minha dor até sentir o toque do sangue na minha garganta. Grito até perder as forças e desfalecer. Levanto-me, a dor permanece, odeio tanto como amo. Sinto, mais fortemente, a condenação de amar e de morrer. Sou um estranho, até para mim mesmo. Não sou quem sou.
Olho em redor, guardo a imagem para sempre. Desço, acompanhado da mesma dor, do mesmo desespero . A morte é a mesma. Amo tal como odeio. Desço, recolho a casa. Não estás em casa meu amigo. Mas sei que estás no vento. Sei-o porque o vento me acaricia da mesma maneira que a tua mão rugosa me acariciava a cabeça quando eu era criança, sei-o porque tem o mesmo toque que a tua mão tinha na minha pele dura de adulto.
Tenho saudades tuas!